quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

A Fé e a Crise.


Ao chegar ao poder, a direita, na esteira do discurso de posse de Cavaco, adoptou uma visão albanesa da crise. Toda a culpa era nacional, a magia da mudança seria a substituição do Governo por uma maioria amiga dos mercados.
Os portugueses acreditaram. Pouparam Cavaco ao incómodo de uma segunda volta, correram com Sócrates, concretizaram o sonho hegemónico de Sá Carneiro e colocaram no Governo um conjunto de adoradores da força libertadora dos mercados que torna moderados os clássicos do PSD e põe o CDS escondido atrás da cortina.

O povo ordeiro, a oposição mais responsável da Europa e sindicalistas institucionalistas tornam Portugal o Paraíso Triste que enleva os observadores internacionais pela candura no sofrimento sem montras partidas nem pombas assassinadas.
A ingratidão supera tudo. Os juros estão ao dobro de há um ano, os ratings afundam-se no lixo, os bancos limpam prejuízos secando as empresas e esperando a solidariedade passiva do Estado, o desemprego ultrapassa o milhão e até a chuva deserta, colocando autarcas à beira do desespero e agricultores na volúpia do subsídio.

A questão decisiva, como disse Krugman é que austeridade não é a chave para a competitividade e que Passos nada pode na crise global. A irrelevância estratégica de Portugal levou a que Passos fosse ignorado na carta liberal de Cameron e amigos, apelando, até eles, a que se dê atenção ao crescimento e emprego.
Para o desemprego, para a retoma económica e para a seca, a resposta deste Governo fundamentalista está na fé. Um pouco de chuva e talvez não seja preciso incomodar Bruxelas, um pouco de paz nos mercados e talvez se evite o segundo resgate, um pouco de alívio europeu e talvez a recessão não nos torne na Grécia de amanhã.

A tragédia da lei dos compromissos é a marca de uma estratégia de curto prazo para troika ver de aplicação inviável, a não ser que seja defraudada como admitem as autarquias e os hospitais. Assunção Cristas e Vítor Gaspar são os símbolos de uma governação baseada no mistério da fé que um dia nos dará a graça dos milagres da chuva e dos mercados.

Eduardo Cabrita, Deputado do PS

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