quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O poder local soma e segue para o abismo.


Os autarcas são os reis e senhores dos partidos. A factura já chegou a S. Bento.

Pedro Passos Coelho apresentou ontem a sua recandidatura à liderança do PSD. Ao seu lado, como sempre, lá estava Fernando Ruas, presidente da Câmara de Viseu, pai das rotundas portugueses e também presidente da Associação Nacional de Municípios. Dito isto, percebem-se muito bem as dificuldades do poder político, do governo, do independente e rigoroso ministro das Finanças e da própria troika em pôr na ordem o poder local. Há muitos anos que tomaram o freio nos dentes e não há crise, austeridade e sacrifícios que os comovam. Os autarcas do bloco central, do PSD e do PS, que controlam mais de 90% das autarquias do país, são os verdadeiros donos dos partidos e os padrinhos de todos os líderes. Não há vitórias eleitorais sem o apoio empenhado dos autarcas e também não há financiamento partidário sem a boa vontade dos eleitos locais.
O governo, este e os que o antecederam, está prisioneiro desta lógica perversa, em que o poder local dita as regras do jogo, bate o pé quando algo não é do seu agrado e consegue, sem excepção, levar a água ao seu moinho. É por isso que a carta enviada pelos ministros Vítor Gaspar e Miguel Relvas aos municípios, suplicando-lhes que divulguem todos os calotes e não escondam cadáveres nos armários, é perfeitamente patética. Apelar ao patriotismo, ao sentido de Estado, à lealdade, à credibilidade e à responsabilidade dos autarcas é admitir que o poder central é incapaz de se impor e de se fazer respeitar pelos autarcas.

No fundo, é a confissão de uma total impotência para levar a lei e a ordem aos 308 municípios. Esta impotência não é de agora. Já se manifestou quando o governo desistiu de avançar com a redução de câmaras municipais, recuou nos limites ao endividamento e abriu uma série de excepções à redução de funcionários. E mesmo no escandaloso dossiê das empresas municipais ainda é cedo para se perceber o que vai realmente acontecer.
É patético ver um governo no poder há oito meses saber tudo o que se passa nas empresas públicas, na administração central, nas regiões autónomas e nos bancos e continuar às cegas quanto às dívidas das câmaras e dos seus inúmeros apêndices empresariais. Se não fosse uma tragédia, dava uma excelente anedota. O rigor, a austeridade e até os elogios da troika ao cumprimento do Memorando encalham no querido poder local. Ainda ontem, na conferência de imprensa dada por Vítor Gaspar sobre a terceira avaliação externa, o ministro das Finanças não escondeu uma certa ironia quando afirmou que sabia da existência de um número sobre as dívidas das câmaras, mas não se lembrava qual era. Pois não, senhor ministro. Não sabe o senhor e muito menos o ministro que tutela os senhores que mandam nos partidos e impõem a sua lei ao país. O poder local anda há muito tempo a brincar com as empresas e com o trabalho de milhões de portugueses.

Faz muitas obras de fachada, em particular nos anos em que é preciso captar os votos do eleitorado, e demora eternidades a pagar as facturas. E ninguém o põe na ordem. Percebe-se porquê. É que quem manda pode. E quem manda neste país, infelizmente, já não é o Terreiro do Paço. Por obra e graça dos degradados pilares desta pobre e miserável democracia de mão estendida.

Jornal I - António Ribeiro Ferreira

A Fé e a Crise.


Ao chegar ao poder, a direita, na esteira do discurso de posse de Cavaco, adoptou uma visão albanesa da crise. Toda a culpa era nacional, a magia da mudança seria a substituição do Governo por uma maioria amiga dos mercados.
Os portugueses acreditaram. Pouparam Cavaco ao incómodo de uma segunda volta, correram com Sócrates, concretizaram o sonho hegemónico de Sá Carneiro e colocaram no Governo um conjunto de adoradores da força libertadora dos mercados que torna moderados os clássicos do PSD e põe o CDS escondido atrás da cortina.

O povo ordeiro, a oposição mais responsável da Europa e sindicalistas institucionalistas tornam Portugal o Paraíso Triste que enleva os observadores internacionais pela candura no sofrimento sem montras partidas nem pombas assassinadas.
A ingratidão supera tudo. Os juros estão ao dobro de há um ano, os ratings afundam-se no lixo, os bancos limpam prejuízos secando as empresas e esperando a solidariedade passiva do Estado, o desemprego ultrapassa o milhão e até a chuva deserta, colocando autarcas à beira do desespero e agricultores na volúpia do subsídio.

A questão decisiva, como disse Krugman é que austeridade não é a chave para a competitividade e que Passos nada pode na crise global. A irrelevância estratégica de Portugal levou a que Passos fosse ignorado na carta liberal de Cameron e amigos, apelando, até eles, a que se dê atenção ao crescimento e emprego.
Para o desemprego, para a retoma económica e para a seca, a resposta deste Governo fundamentalista está na fé. Um pouco de chuva e talvez não seja preciso incomodar Bruxelas, um pouco de paz nos mercados e talvez se evite o segundo resgate, um pouco de alívio europeu e talvez a recessão não nos torne na Grécia de amanhã.

A tragédia da lei dos compromissos é a marca de uma estratégia de curto prazo para troika ver de aplicação inviável, a não ser que seja defraudada como admitem as autarquias e os hospitais. Assunção Cristas e Vítor Gaspar são os símbolos de uma governação baseada no mistério da fé que um dia nos dará a graça dos milagres da chuva e dos mercados.

Eduardo Cabrita, Deputado do PS

Não sabe, não mexe.


O programa de apoio ao emprego jovem anunciado pelo governo português é uma medida inútil. Provavelmente, contraproducente e até injusta. Apesar disso, tem o suporte da Comissão Europeia e Durão Barroso manifestou o seu entusiástico apoio ao projecto.

Os programas publicitados nem sequer existem. E ainda bem. Porque se há coisa que os governantes não sabem mesmo, é criar empregos.

Essa tarefa deve ser deixada aos empresários, já que só através do surgimento de novas empresas e do crescimento das já existentes se cria emprego. Ao estado competiria criar um contexto favorável ao funcionamento da economia e à subsequente criação de riqueza.

O que não acontece em Portugal. Assim, um estado que não faz bem o que lhe compete, não deve tentar outras aventuras.

E se a criação de emprego não cabe aos governos, muito menos devem os políticos favorecer o emprego dos jovens, ou a qualquer grupo particular.

Ao discriminarem positivamente um determinado segmento da sociedade, estão a discriminar negativamente todos os outros. Por que motivo há-de o governo beneficiar, de forma sectária, o emprego para os jovens? E os desempregados de meia-idade? Admitir-se-ia que se favorecesse o emprego dos homens em detrimento das mulheres?

Este tipo de apoios é aliás perverso, pois muitos patrões serão tentados a substituir funcionários competentes por outros que pertençam a grupos beneficiários de incentivos ou subsídios e, logo, mais baratos.

Os governantes que pensam criar programas de emprego deveriam deixar-se disso. Se não sabem, não mexam! Mas se de facto sabem como criar emprego, demitam-se já do governo e dediquem-se à vida empresarial. Os desempregados agradecem.

Quanto a Durão Barroso, o seu apoio só pode ser entendido à luz da vontade de ficar bem-visto perante o eleitorado jovem, que poderá ajudá-lo numa eleição presidencial de 2016. Ou seja, o único emprego que o programa de apoio ao emprego jovem ainda poderá vir a criar é o de Durão Barroso como Presidente da República. Um único emprego, que nem sequer é jovem.

Paulo Morais, Professor Universitário

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Máscaras de Carnaval.


Pode alguém ser quem não é? No Carnaval, há muitos que tentam parecer quem não são.

 A máscara do governo é não deixar pôr máscara de Carnaval. Não dar tolerância de ponto aos funcionários públicos passa por “austeridade” para troika ver, quando se sabe que na realidade o impacto na produtividade será irrelevante. A máscara de Cavaco Silva é a pior das máscaras que um Presidente da República pode colocar, a de rei inatingível e alheio aos problemas do povo. À frente do corso, finge não ouvir a multidão. António José Seguro hesita entre colocar a máscara da oposição e a da austeridade sofrida. Há outros, que o leitor poderá apontar. Os mascarados não nos divertem nem (suspeito) se divertem. É um Carnaval triste. Os únicos que se dão ao luxo de não colocar máscaras são os que têm real poder. Merkel, que já não finge preocupar-se com a Grécia. Ou Putin, que grita que vai rearmar a Rússia. Ou os empresários que fogem aos impostos transferindo os seus negócios para outros estados. Ou ainda o novo cardeal dos católicos que causa escândalo ao falar, sem máscara, da concepção genuinamente católica do lugar das mulheres. As máscaras, por um dia ou por uma vida, tentam convencer-nos de que não somos quem somos. Até ao dia em que caem. Que venha depressa.

Jornal I - Ricardo Alves

Porque em Portugal o “J” é a primeira letra do alfabeto...


Acabei de saber que a JSD vai apresentar 35 medidas contra o desemprego na juventude. Finalmente uma boa notícia para todo o país! Assim vale a pena ler jornais. É que uma pessoa também se farta de estar sempre a levar com desgraças, como as notícias sobre os conflitos na Grécia, a fome em África ou a Nereida Gallardo estar a pensar tirar os implantes. Felizmente, ainda há quem nos dê alegrias. É que com a JSD a tratar do assunto é limpinho: acabou-se o desemprego. Eles nisto são craques. Pelo menos eu nunca vi ninguém da JSD desempregado. Eu sei que a esta hora ainda há gente desconfiada e que só vai descansar quando souber mesmo quais são as medidas que a JSD vai apresentar.

A estas pessoas só tenho a dizer duas coisas: a melhor maneira de tirar marcas de batom de uma camisa é aplicando vaselina sobre a nódoa, lavando em seguida com água e sabão; agora calminha, que eu tenho uma surpresa para vocês. Pois é, caros amigos, após um esforço, que a minha sobejamente conhecida modéstia não permite apelidar de grandioso, consegui ter acesso ao documento com as medidas que a JSD vai apresentar e, acreditem em mim, o projecto está destinado ao sucesso. Quando as primeiras medidas são do calibre de:

1. Pertencer à JSD;

2. Ter um irmão na JSD;

3. Ter um primo na JSD;

 4. Ter um cunhado na JSD;

5. Ter um amigo na JSD;

6. Ter um amigo que é amigo de alguém na JSD;

 7. Ter um primo que é cunhado de um amigo do irmão de um militante da JSD;

8. Ter os nomes de família separados por "e" ou "de";

 9. Ter um amigo da JP;

10. Publicar no facebook, pelo menos uma vez por semana, fotos de fetos e frases anti-aborto

 – qualquer pessoa percebe que é desta que a coisa vai. Por isso é que estou tão confiante!

Aliás, eu se estivesse no vosso lugar até começava era a meter os papéis no registo civil para tratar já da mudança de nome para Sotto de Mello e Brito ou Mascarenhas de Penha-Pereira, que depois quando isto for oficial aquilo vai estar à pinha. E agora vamos lá, pessoal, isto é bola para frente e aguardar o futuro com um sorriso nos lábios, até porque uma coisa é certa: a última pessoa que contou com apoio total da JSD não só nunca teve de passar um dia no centro de emprego, como hoje tem um trabalhinho de luxo… apesar de continuar a viver em Massamá.

Jornal I - Rui Cruz, Guionista.

Mudanças do PDM são segunda maior causa de corrupção.


A administração local é a maior incubadora da corrupção em Portugal. A alteração do plano director municipal (PDM) ou projectos por interesses económicos ilegítimos é uma das principais motivações dos actos corruptos, sendo registada em 50 dos 345 casos analisados pelo Ministério Público entre 2004 e 2008. Os dados são de um estudo do Instituto de Ciências Sociais (ICS) que mostra que as alterações estão normalmente associadas ao “nepotismo, favoritismo, clientelismo e conflito de interesses”.

 Um ex-autarca do Porto e uma antiga administradora da área do urbanismo em Lisboa – que lutaram contra ilegalidades – explicam como funcionam as negociatas e contam que pressões sofreram.

 O estudo intitulado “A corrupção participada na administração local em Portugal (2004-2008), elaborado por Inês Lima em 2011, tem por base uma anterior investigação do ICS (realizada em colaboração com o Departamento de Investigação e Acção Penal) e teve como amostra 345 processos instaurados por corrupção.

 O trabalho – apresentado como tese de mestrado – inclui um levantamento das motivações do ato corrupto. A “alteração do PDM ou projectos” apenas é batida pelo “desvio de verbas/apropriação de dinheiro” (80 casos). A análise foi coordenada pelo sociólogo e autor de estudos sobre a corrupção, Luís de Sousa, que explica ao DN que “a nível local um dos principais focos de corrupção está na área do urbanismo e, acima de tudo, na fase de planificação, onde se incluem os PDM”. O professor do ICS lembra que “uma linha de PDM pode representar diversos metros quadrados”.

 O estudo diz ainda que, entre os arguidos nos processos de corrupção, os políticos dominam (27,6% dos sujeitos passivos), seguidos dos “quadros superiores da administração pública, dirigentes e quadros superiores de empresas” (21,4%).Luís de Sousa explica que “temos um urbanismo que responde muitas vezes aos interesses instalados: o director de um serviço aprova uma alteração e depois o edil não quer levantar problemas, porque muitas vezes trata-se de um investimento e o investidor pode ser o financiador da sua campanha eleitoral”.

 Uma luta quixotesca

 Alvos de pressões políticas foram o antigo vice-presidente da Câmara do Porto, Paulo Morais, e a antiga presidente da Sociedade de Requalificação Urbana de Lisboa, Maria Teresa Goulão. O antigo “vice” de Rui Rio conta ao DN que “os promotores não estão habituadas a que alguém lhes trave os projectos”. Foi por isso que enquanto esteve na câmara do Porto era pressionado por “colegas vereadores, gente do partido e promotores”. No fundo, pediam-lhe que contornasse a lei para que outros ganhassem milhões. Recusou entrar no esquema e a sua saída da autarquia tornou-se inevitável, embora ilibe o ainda presidente dessas manobras.

 Paulo Morais é bastante crítico da forma como as coisas são geridas a este nível, denunciando que “o que temos hoje não são PDM, são bolsas de tráfico de solos. A entidade que arbitra, as autarquias, não é imparcial, pois arbitra em favor daqueles que têm influência política.” O ex-autarca classifica a urbanização como um “negócio que dá lucros de 800%/900%, que só tem paralelo em Portugal com o tráfico de droga e, tal como essa área, tem máfias e negócios escuros envolvidos”.

 Enquanto vereador, reprovou imensos projectos por serem uma “imoralidade”. Entre os seus cavalos de batalha destacam-se casos como o da Quinta da China, o Sport Clube do Porto e o campo de treinos do Salgueiros.

 Quem também enfrentou a corrupção foi Maria Teresa Goulão. “Uma batalha de D. Quixote. Sozinha. Sofri uma pressão feita em termos muito graves de pessoas com enormes responsabilidades e a quem eu belisquei algum interesse.”

 Teresa Goulão considera que as negociatas ao nível de solos são “a morte silenciosa de Portugal”, criticando a “impunidade” que reina no País. Responsável pelas questões do urbanismo na associação Transparência e Integridade, Associação Cívica (TIAC). Teresa Goulão fez um levantamento de vários dos casos polémicos no sector. Uns prescreveram, outros foram arquivados, e até houve condenações.

 A TIAC vai, aliás, dedicar este ano às questões ambientais, porque o tempo urge. Todos os anos, como explica a consultora ambiental, “a expansão urbana faz que a União Europeia perca uma superfície de solo maior do que a cidade de Berlim (dez vezes o tamanho de Lisboa). E Portugal continua sem um levantamento dos solos contaminados. “A falta de uma política e de uma lei dos solos actual constitui fonte de muitos crimes de corrupção e tráficos de influências”, alerta Teresa Goulão. O que os motiva? “Abancas políticas e de corporação: o dinheiro não tem cor.”

 RUI PEDRO ANTUNES - DN

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Não há economia que resista a este Estado irresponsável.


As empresas públicas não sabem o que é a crise e continuam no carnaval despesista.

Os números do desemprego são horríveis. Não há volta a dar. As previsões do governo vão ser obviamente ultrapassadas e de nada servem palavras piedosas e mais previsões fantasiosas sobre a possibilidade da tendência se inverter no segundo semestre de 2012. E o desemprego dos jovens, que em Portugal já ultrapassa os 35 %, não vai ser resolvido por uma comissão muito especial liderada pelo ministro Miguel Relvas com doze estimáveis secretários de Estado. Para já não falar das brigadas enviadas por Bruxelas para estudar o assunto.
Como dizia o outro, é a economia, estúpidos, que não cria empregos. Não é o Estado e os seus sempre admiráveis investimentos públicos que criam emprego e não são obviamente os ministros e os governos que conseguem ultrapassar a situação com políticas voluntariosas, remendos eleitoralistas, falsos estágios e muitos cursos de formação profissional para melhorar as estatísticas. Só o crescimento económico cria emprego. E para haver crescimento económico é preciso investimento privado, E para haver investimento privado é preciso que os estados e os governos criem as consições para atrair os investidores privados. Sem isso nada feito. Sem isso, como acontece em Portugal, não há investimento, não há economia, as exportações são uma miséria e a economia vive falsamente do consumo privado e público. Para haver investimento privado e a economia ser competitiva é preciso que o regime fiscal não seja brutal, que a burocracia e a corrupção não matem qualquer projecto à partida, que a legislação laboral não seja rígida e impeditiva de as empresas se adaptarem aos mercados e que a justiça seja eficaz nos tribunais cíveis, do comércio e do trabalho.

Evidentemente que Portugal é tudo menos um país recomendável para o investimento, a não ser que venha pela mão amiga do Estado e de quem está no poder, com muitos benefícios fiscais e facilidades burocráticas que não estão ao alcance do investidor normal. Este governo, empurrado pela troika, prometeu reformas de fundo no Estado, com o objectivo supremo de o reduzir para níveis aceitáveis e baixar, dessa maneira, as suas necessidades de financiamento, isto é, de impostos e dívida pública. Pois bem. Olha-se para o conjunto destes oito meses de governo e a desilusão não pode ser maior. Olha-se para as empresas públicas e não se acredita no que se passa. Aumentam brutalmente os prejuízos e não cumprem os cortes estipulados pelo governo. O monstro e os seus filhotes não sabem o que é a crise e muito menos o desemprego. Continuam imunes a todas os medidas de contenção orçamental e os responsáveis políticos não conseguem pôr ninguém na ordem.

E se isto se passa no buraco empresarial do Estado, vai ser bonito ver o monstro boicotar a lei que impede os serviços públicos de assumirem compromissos financeiros sem terem a garantia de pagamento a tempo e horas. Portugal, dizem uns, não é a Grécia. Os indignados, pelo contrário, acham que devemos ser gregos. Têm toda a razão. Um país como este não merece estar no euro. Um país como este está condenado. E bem condenado.
 Jornal I - António Ribeiro Ferreira

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Alemanha - Ingratidão e falta de memória.


A Alemanha regista a pouco honrosa distinção de ter entrado em bancarrota em 1920 e em 1953. Da última vez, Berlim contou com a ajuda financeira da Grécia.
A ingratidão dos países, tal como a das pessoas, é acompanhada quase sempre pela falta de memória. Em 1953, a Alemanha de Konrad Adenauer entrou em default, falência, ficou Kaput, ou seja, ficou sem dinheiro para fazer mover a actividade económica do país. Tal qual como a Grécia actualmente.
A Alemanha negociou 16 mil milhões de marcos em dívidas de 1920 que entraram em incumprimento na década de 30 após o colapso da bolsa em Wall Street. O dinheiro tinha-lhe sido emprestado pelos EUA, pela França e pelo Reino Unido.
Outros 16 mil milhões de marcos diziam respeito a empréstimos dos EUA no pós--guerra, no âmbito do Acordo de Londres sobre as Dívidas Alemãs (LDA), de 1953. O total a pagar foi reduzido 50%, para cerca de 15 mil milhões de marcos, por um período de 30 anos, o que não teve quase impacto na crescente economia alemã.
O resgate alemão foi feito por um conjunto de países que incluíam a Grécia, a Bélgica, o Canadá, Ceilão, a Dinamarca, França, o Irão, a Irlanda, a Itália, o Liechtenstein, o Luxemburgo, a Noruega, o Paquistão, a Espanha, a Suécia, a Suíça, a África do Sul, o Reino Unido, a Irlanda do Norte, os EUA e a Jugoslávia. As dívidas alemãs eram do período anterior e posterior à Segunda Guerra Mundial. Algumas decorriam do esforço de reparações de guerra e outras de empréstimos gigantescos norte-americanos ao governo e às empresas.
Durante 20 anos, como recorda esse acordo, Berlim não honrou qualquer pagamento da dívida.
Por incrível que pareça, apenas oito anos depois de a Grécia ter sido invadida e brutalmente ocupada pelas tropas nazis, Atenas aceitou participar no esforço internacional para tirar a Alemanha da terrível bancarrota em que se encontrava.
Ora os custos monetários da ocupação alemã da Grécia foram estimados em 162 mil milhões de euros sem juros.
Após a guerra, a Alemanha ficou de compensar a Grécia por perdas de navios bombardeados ou capturados, durante o período de neutralidade, pelos danos causados à economia grega, e pagar compensações às vítimas do exército alemão de ocupação. As vítimas gregas foram mais de um milhão de pessoas (38 960 executadas, 12 mil abatidas, 70 mil mortas no campo de batalha, 105 mil em campos de concentração na Alemanha, e 600 mil que pereceram de fome). Além disso, as hordas nazis roubaram tesouros arqueológicos gregos de valor incalculável.
Qual foi a reacção da direita parlamentar alemã aos actuais problemas financeiros da Grécia? Segundo esta, a Grécia devia considerar vender terras, edifícios históricos e objectos de arte para reduzir a sua dívida.
Além de tomar as medidas de austeridade impostas, como cortes no sector público e congelamento de pensões, os gregos deviam vender algumas ilhas, defenderam dois destacados elementos da CDU, Josef Schlarmann e Frank Schaeffler, do partido da chanceler Merkel. Os dois responsáveis chegaram a alvitrar que o Partenon, e algumas ilhas gregas no Egeu, fossem vendidas para evitar a bancarrota.
“Os que estão insolventes devem vender o que possuem para pagar aos seus credores”, disseram ao jornal “Bild”.
Depois disso, surgiu no seio do executivo a ideia peregrina de pôr um comissário europeu a fiscalizar permanentemente as contas gregas em Atenas.
O historiador Albrecht Ritschl, da London School of Economics, recordou recentemente à “Spiegel” que a Alemanha foi o pior país devedor do século xx. O economista destaca que a insolvência germânica dos anos 30 faz a dívida grega de hoje parecer insignificante.
“No século xx, a Alemanha foi responsável pela maior bancarrota de que há memória”, afirmou. “Foi apenas graças aos Estados Unidos, que injectaram quantias enormes de dinheiro após a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, que a Alemanha se tornou financeiramente estável e hoje detém o estatuto de locomotiva da Europa. Esse facto, lamentavelmente, parece esquecido”, sublinha Ritsch. O historiador sublinha que a Alemanha desencadeou duas guerras mundiais, a segunda de aniquilação e extermínio, e depois os seus inimigos perdoaram-lhe totalmente o pagamento das reparações ou adiaram-nas. A Grécia não esquece que a Alemanha deve a sua prosperidade económica a outros países. Por isso, alguns parlamentares gregos sugerem que seja feita a contabilidade das dívidas alemãs à Grécia para que destas se desconte o que a Grécia deve actualmente.

Jornal I -  Sérgio Soares

sábado, 18 de fevereiro de 2012

“Estão a matar o nosso pão”.


Os mariscadores da Lagoa queixam-se que a intervenção que está a ser feita na Lagoa de Óbidos põe em risco o seu trabalho e que já lhes trouxe prejuízos.
 “A área onde estavam habituados a tirar amêijoa e mexilhão está neste momento a ser soterrada e calcada com milhões de quilos de areia, na zona junto ao cais”, denuncia João Penedos, tornando pública a queixa de muitos dos que tiram o sustento daquele local.

Fernando Baltasar, mais conhecido por Fernando Loca, é um desses casos. Mariscador e pescador há 35 anos, diz que “estão a matar o nosso pão”, com a colocação de areia na zona do cais, no local onde antes apanhavam amêijoa, berbigão e mexilhão.

“Estou farto de correr empreiteiros para ver se encontro alguma coisa para fazer”, conta Fernando Loca que, sem outro meio de subsistência, nos últimos tempos tem recorrido ao apoio de amigos.

 Também Rodrigo Gomes, pescador e mariscador desde 1997, está a deparar-se com dificuldades e tem que contar com a ajuda de familiares.
Diz sentir revolta ao ver a intervenção que está a ser feita e que põe em causa o seu sustento. “Vão matar o marisco com esta areia que estão a colocar nas margens pois deixa de ter oxigenação”, explica.

A esta situação junta-se a proibição, por parte do IPIMAR (Instituto das Pescas da Investigação e do Mar) – a entidade que regula a apanha de bivalves -  da captura de marisco, entre os meses de Janeiro e Maio.

Esta entidade atribui a classificação de A, B e C à qualidade da água e dos bivalves que nela vivem numa escala que vai da comercialização sem restrições (A) à obrigatoriedade de transformação e depuração (C). Habitualmente, na lagoa não há classificação A, sendo a B permitida para os meses de Verão e a C para o Inverno.

Os mariscadores queixam-se que têm as licenças pagas e que não podem trabalhar.

 Fátima Ferreira - fferreira@gazetacaldas.com

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O impedimento do Presidente.


“Impedimento” é a nova entrada no dicionário político do cavaquês. “Impedimento” igual a fuga, dificuldade em enfrentar a rejeição, temor das multidões, síndrome de ataque de pânico face a uma situação de risco. Apesar de “impedimento” ter sido introduzido ontem, estes significados da palavra foram uma constante da história política de Aníbal Cavaco Silva. Basta lembrar a overdose de agentes de segurança, uma proverbial imagem de marca do actual Presidente desde os tempos em que era primeiro-ministro e tinha um país pacífico aos pés. O aparato era substancial também nas idas à praia.
Cavaco Silva não mudou grande coisa. Infelizmente para ele, mudaram as circunstâncias. A sua capacidade de influência praticamente desapareceu desde que o governo é liderado por Pedro Passos Coelho, um notório anticavaquista desde os gloriosos tempos em que era muito difícil ser- -se anticavaquista. A geração social-democrata que está no poder, que cresceu com o cavaquismo, tornou- -se adulta precisamente no auge da sua decadência, lá no meio dos anos 90. Na sequência deste processo, a geração passista criou armaduras contra a força de Cavaco. Agora, como já muita gente reparou, é muito difícil encontrar cavaquistas de relevo, com a amantíssima excepção de Manuela Ferreira Leite, a quem Cavaco Silva, no processo insano das “escutas de Belém”, destruiu a campanha eleitoral. A falta de pessoal é tão grande naquelas bandas que até António Capucho, o estratego da candidatura de João Salgueiro no congresso da Figueira da Foz, chega às vezes a ser identificado como “cavaquista”.

Apesar dos desatinos estratégicos de Cavaco na presidência – o caso das escutas de Belém e a dramatização do Estatuto dos Açores –, os últimos tempos do socratismo foram uma excelente bóia de salvação para o Presidente da República. A sua influência era medida em cada orçamento, em cada PEC, e foi o recurso dos banqueiros e dos pobres até às eleições antecipadas. Depois tudo mudou. Cavaco Silva não conseguiu nunca ser a favor do programa do governo (uma coisa “ainda mais longe” que o programa da troika) ou contra o programa do governo. Ficou ali no meio, exasperado com a maior das depressões para os animais políticos: a total volatilização do seu poder e influência. Em Portugal mandam Passos Coelho, Vítor Gaspar, Miguel Relvas. Acima desta trindade (e mais que eles) mandam a senhora Merkel e o parlamento alemão. Cavaco não manda rigorosamente nada.
Este caldeirão desagradável ferveu com uma gafe penosa que chocou o país – a das reformas e do “dinheiro que não chega para as despesas”. Os portugueses, ainda bastante contemporizadores com o governo, como dizem as sondagens, canalizaram o seu ódio latente para uma frase terrível da primeira figura do Estado. Azar dos Távoras, Cavaco não se consegue demarcar do governo nem do programa da troika – nem consegue ser um apoiante eficaz. Está ali no meio, a ver para onde param as modas, assistindo à erosão da sua influência e ao sucesso nas sondagens (ainda) de um PSD que lhe não é devedor. Qualquer um fugia.

Jornal I - Ana Sá Lopes

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Petição exige dragagens permanentes na Lagoa de Óbidos.


Uma petição a exigir a dragagem permanente da Lagoa de Óbidos foi ontem apresentada por um movimento cívico, que entende ser insuficiente a actual retirada de

 O grupo apresentou, publicamente, a petição subscrita até agora por 1363 pessoas em defesa de “um ecossistema frágil com tendência para o desaparecimento” se não for alvo de “uma acção segura, contínua e abrangente em toda a sua linha”.

 De acordo com o grupo, a dragagem de 350 mil metros cúbicos de areia que está a ser levada a cabo pelo Instituto Nacional da Água (INAG) “é insuficiente” e não resolve os “problemas de poluição e assoreamento da lagoa”.

 O movimento anunciou a intenção de promover ações de rua para intensificar a recolha de assinaturas, com o objectivo de atingir os quatro mil subscritores da petição que será entregue na Assembleia da República.

 A areia retirada da lagoa está a ser utilizada para reforçar as dunas nas margens norte (na Foz do Arelho, no concelho de Caldas da Rainha) e sul (na zona do Bom Sucesso, concelho de Óbidos).

 A obra, adjudicada à empresa Irmãos Cavaco, deverá estar concluída no próximo mês de Março.

 Lusa/VidaFm

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Fogo bacteriano ameaça pomares do Oeste.


O Partido Socialista exigiu ao Governo que accione um plano de emergência para a erradicação do fogo bacteriano, doença que ameaça destruir dois mil hectares de pomares de pêra rocha do Oeste.

Os deputados socialistas da Comissão Parlamentar de Agricultura visitaram na semana passada pomares de Alcobaça, Cadaval e Torres Vedras, e foram sensibilizados por produtores de pêra rocha para o perigo de contaminação de fogo bacteriano a toda a região Oeste.

“Estamos perante uma bomba relógio em contagem decrescente”, considerou à agência Lusa Miguel Freitas depois de visitar pomares e ouvir os produtores de pêra rocha.

Segundo o deputado, se não forem tomadas medidas com vista à rápida erradicação da doença, “corre-se o risco de ver afectados dois mil dos 10 mil hectares de pomar de pera rocha”, que o representaria uma perda de “cerca de 20 por cento” da área de pomar entre Mafra e Alcobaça.

O sector que “representa 300 milhões de euros de facturação anual e 10 mil postos de trabalho” justifica, segundo o deputado, que “seja rapidamente accionado um plano de emergência que contemple apoios ao arranque das árvores e posteriormente a replantação das áreas afectadas”.

A doença, de propagação rápida e cuja erradicação obriga ao arranque das árvores e um impedimento de dois anos até à replantação, levou já à criação, na Assembleia da República, de um grupo de trabalho, sobre o qual os socialistas irão igualmente questionar a tutela.

“Queremos conhecer os resultados do trabalho desenvolvido por esse grupo”, bem como, “qual a capacidade instalada do ministério, no terreno, para fazer face a esta doença” afirmou Miguel Freitas.

Para além de Alcobaça e Torres Vedras, as duas zonas mais afectadas por fogo bacteriano, os deputados visitaram ainda pomares do concelho do Cadaval onde, “não há ainda registo de nenhum caso” mas, alerta Miguel Freitas, “a convicção dos produtores é que se trata apenas de uma questão de tempo” até que a doença surja.

A doença conhecida como “Fogo Bacteriano” entrou na Europa na década de 60, sendo responsável pela destruição de pomares em vários países.

Em Portugal os primeiros casos apareceram em 2005 e, em 2010, a doença começou a afectar os pomares da região Oeste.



Jornal das Caldas

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Mais de 2 milhões de portugueses viviam em risco de pobreza em 2010.


O risco de pobreza é maior em Portugal que no resto da Europa: em 2010, um em cada quatro portugueses vivia ameaçado de pobreza ou de exclusão social. Apesar de na Europa o risco também se ter agravado entre 2009 e 2010 – a média da União Europeia (UE) a 27 situou-se nos 23,4% –, em Portugal, diz o Eurostat, os números ultrapassaram os 25%.
De acordo com os números do gabinete de estatísticas da UE, 25,3% dos portugueses viveram ameaçados de pobreza no ano de 2010, mais 0,4% que em 2009. Ao todo, na UE, 115 milhões de pessoas viveram em risco de pobreza.
Em Portugal, esse risco atingiu 2,6 milhões de cidadãos e foi muito mais acentuado entre os jovens: 28,7% dos portugueses até aos 17 anos, tal como os gregos, vivem com esse fardo. O risco de pobreza desce entre a população entre os 18 e os 64 (24,1%) e volta a subir ligeiramente entre os idosos (26,1%). Recorde-se que em Portugal há um milhão de idosos a viver com menos de 280 euros por mês.
Os números não surpreendem Eugénio Fonseca, presidente da Cáritas portuguesa: “Já há algum tempo que digo que as medidas tomadas pelo governo foram as que disfarçaram os números de 2008, quando a taxa de pobreza desceu para os 17,8%. Basta que se tomem outras medidas ou que o desemprego aumente para se deitar abaixo o trabalho feito.”

Quem lida com a população mais carenciada teme que a ameaça de pobreza venha a assombrar muito mais portugueses, já que o cálculo de 2010 foi feito de acordo com os rendimentos de 2009 e o desemprego demora algum tempo a reflectir-se nos agregados familiares. “Estes números não são reais”, lembra Eugénio Fonseca, a quem a experiência no terreno diz que os factores que mais contribuem para a pobreza são o desemprego e a precariedade no trabalho.

Além disso, “as estatísticas são muito vulneráveis”. “Há pessoas que já não procuram os centros de emprego, aqueles a quem chamo os desiludidos com o mercado de trabalho e aqueles que não entram nas estatísticas, porque já perderam o direito ao subsídio ou porque fizeram umas horas de trabalho.”

À Cáritas, os pedidos de ajuda não param de chegar. “Só temos possibilidade de ajudar nas necessidades básicas: que não passem fome, que tenham medicamentos e que não percam a casa. E neste campo a nossa ajuda é a demora dos tribunais. Caso contrário, haveria muito mais pessoas sem casa e a dormir nas ruas”, alerta o presidente da Cáritas.

Critérios O Eurostat considera que vivem em risco de pobreza os que têm rendimentos 60% inferiores à média nacional, os que suportam uma “grave privação material” e estão impedidos de pagar a renda de uma casa ou adquirir bens básicos e ainda aqueles que utilizaram menos de 20% do seu potencial de trabalho no último ano, à excepção dos estudantes.

Espanha está entre os países onde a ameaça de pobreza mais aumentou, sendo o oitavo país em maior risco: 11,5 milhões de espanhóis foram atingidos em 2010. Bulgária (42%), Roménia (41%) e Letónia (38%) são os países em pior situação; República Checa (14%), Suécia e Holanda (ambos com 15%), Áustria, Finlândia e Luxemburgo (com 17%) são os locais da Europa onde o risco de pobreza é menor de acordo com os indicadores ontem divulgados em Bruxelas

Sílvia Caneco, Jornal I

Na vida real não há tempo para pieguices!


Os pedidos de Passos Coelho aos portugueses – “mais exigentes”, “menos complacentes” e “menos piegas” – só reforçam a sobranceria com que os governantes portugueses, à imagem dos europeus, olham a crise. Uma sobranceria que agrava o fosso entre dirigentes e dirigidos (cada vez mais insultados) e que se manifesta de diferentes formas de capital em capital, mas com uma característica comum: a dissociação da vida real. Na UE insistem nas ameaças para impor mais austeridade na Grécia, achando que as notícias que falam de um quase colapso social patrocinado por Bruxelas, Paris e Berlim são exageradas – isto apesar do ódio a estas capitais ser já comum em Atenas. Voltemos a Passos e ao autismo perante a vida real.
Quer portugueses “menos piegas”. Ok, mas uma dúvida: os piegas são os estudantes que desde este mês pagam mais 58% pelo passe? Ou serão os alunos do escalão A da acção social (menos de 209 euros por mês), que passaram a pagar mais 5% a 21%? Ou os portugueses com menos de 700 euros por mês que pagam 23% de IVA na electricidade? Ou os 2,7 milhões de pobres que o Eurostat diz que temos? Fica a dúvida. “Menos complacentes.” Bem dito e a ironia é deliciosa: temos de ser menos complacentes com os que acham que a austeridade se faz à custa dos mais fracos e com a pobreza a que condenaram o país. Mas tal não implica apontar o dedo a quem nos quer menos complacentes? Temos também de ser “mais exigentes”. Certo, sobretudo com quem nos lidera e com os que têm um CV pouco exigente, demasiado complacente e alimentado de pieguices.

Porque na vida real ninguém enche o CV com lugares dourados caídos do céu nem tão-pouco consegue chegar a algum lado a trabalhar apenas nas férias de actividades políticas. Imagine que o seu CV era professor durante um ano aos 19, depois outro emprego só aos 25 anos, e durante dois anos. Por fim contava com nova experiência profissional só aos 36 anos. Acha que este CV ia valer-lhe a entrada directa em dezenas de administrações? Talvez não. Porém, e para quem nos lidera, este percurso é normal, ao alcance de todos de tão fácil que foi, daí não existirem razões para que os portugueses tanto se queixem. É tudo muito fácil quando se vive no País das Maravilhas...

Filipe Paiva Cardoso, Jornal I

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Somos mesmo piegas?


Na escola onde deu aulas (acusada há pouco de inflacionar notas para benefício dos seus formandos), Passos Coelho pôs-se a tartamudear sobre alunos e ensino, lembrando-se às tantas de excomungar os “piegas”. A lengalenga da exigência, com uma pitada de brutalidade darwinista. Nada de novo, portanto. A criatura, que de Sócrates só herdou a boçalidade, continua sem cabecinha nem assessores para lhe assinalar quando reprimir os disparates que lhe assomam às meninges. Mas ignora o que seja um símile ou uma metáfora.

Mesmo assim, a nação acusou logo o dói-dói: “Passos pede aos portugueses para serem ‘menos piegas’”, titulou o site do nosso jornal de referência mais espesso. E lá veio a costumeira maré de queixumes, choraminguices, ranger de dentes e rasgar de vestes. Ai que ele nos chamou “piegas”!

Não. Não chamou. Mas devia ter chamado. Quem se ofende tanto com as bocas de um zero à esquerda admite que vale menos que nada. Afinal falamos de uma nódoa académica, licenciada (na Lusíada) tarde e a más horas, mas a tempo de arredondar o CV. De um cromo que deu aulas de Matemática liceal durante um ano, sem ter concluído o curso – em dias de nula exigência, presumo. Um fulano que depois disso viveu abrigado sob a asa do partido e do padrinho Ângelo. Eis o perfil de quem agora nos incita a “não termos pena dos alunos coitadinhos que sofrem tanto para aprender”.

Repito: quem se deixa ofender por este títere oco, insensível e vaidoso está apenas a ofender-se a si mesmo.

Luís Rainha, Jornal I

Militares avisam que "nada os obriga a serem submissos"


Em carta aberta ao ministro da Defesa, a Associação dos Oficiais das Forças Armadas avisa: "Nada nos obriga a ser submissos, acomodados, ignorantes e apolíticos".
A Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA) escreveu uma carta aberta ao ministro da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, com uma mensagem bem clara: "Nada nos obriga a ser submissos, acomodados (pelos vistos daria jeito ao poder político que assim fosse), ignorantes e apolíticos".

O documento revelado hoje pelo Diário de Notícias é uma resposta às recentes declarações de Aguiar-Branco que acusou "as associações profissionais de militares de fazerem política, até partidária".

 "Utilizar o protesto militar como forma de intervenção pública, política e partidária é grave", ou "se não sentem vocação, estão no sítio errado. Antes de protestar precisam de mudar de carreira", afirmou o ministro recentemente.

 A resposta não se fez esperar. Hoje na referida carta aberta os militares acusam José Pedro Aguiar-Branco de falta de "clarividência" e dizem que as medidas do Governo "estão carregadas de falta de respeito".
"As Forças Armadas são insustentáveis, senhor ministro? Não são! Estão!", argumenta a AOFA, que contesta também os cortes orçamentais e a equiparação dos militares aos funcionários públicos. Outras queixas têm a ver directamente com a carreira, como o congelamento das promoções.

http://www.dn.pt/politica/interior.aspx?content_id=2291370&page=-1

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Uns trabalham! Outros lucram!


Todos os anos na União Europeia são deitados fora cerca de 50% dos alimentos em condições comestíveis. São cerca de 89 milhões de toneladas de comida não utilizada, o que, atendendo à população dos 27 Estados membros, significa uma média de 179 Kg por pessoa. Mas, o mais incrivel é que, no mesmo espaço onde se desperdiça tudo isto, vivem cerca de 79 milhões de pessoas abaixo do limiar da pobreza, sem acesso a alimentos suficientes.

O desperdício alimentar verifica-se a todos os niveis da cadeia agroalimentar, desde os campos agrícolas, às indústrias de transformação, às empresas de distribuição e às casas dos consumidores, contudo, estima-se que seja precisamente ao nível do consumidor que ele seja maior, cerca de 42% ( 60% do qual poderia ser evitado).

Este desperdício não é, nem pode ser uma inevitabilidade. Algo tão simples como a venda a granel, que permitiria ao consumidor adquirir uma quantidade mais próxima às suas reais necessidades, ou a alteração do tamanho das embalagens, contribuiria para diminuir significativamente o desperdício. Do mesmo modo, a adopção generalizada de práticas já existentes em alguns países, por parte das superfícies comerciais, que reduzem o preço dos alimentos cuja data de validade se aproxima do fim.

No entanto, enquanto a cadeia agroalimentar for dominada pelos interesses da indústria e das grandes cadeias de distribuição, o desperdício substituirá, os produtores continuarão a ter de produzir massivamente como forma de diminuir os prejuízos. Seria pois importante introduzir também a este nível mecanismos que impedissem as actuais distorções do mercado, que levam a que os produtores tenham que vender às distribuidoras abaixo do preço de custo, ficando aquelas com todo o lucro.

Cláudia Oliveira – Região de Leiria

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Historiadores de Óbidos dão a conhecer a evolução das muralhas do castelo.


Cerca de 20 pessoas participaram na visita guiada ao castelo de Óbidos feita pelos historiadores João Pedro Tormenta e Ricardo Pereira, durante a manhã de 14 de Janeiro. Os participantes tomaram conhecimento do que ocorreu no burgo no longínquo ano de 1148, aquando da sua tomada aos mouros pelo rei D. Afonso Henriques.
De acordo com os especialistas, os dados arqueológicos, arquitectónicos e documentais existentes sobre o castelo de Óbidos apontam para uma “evolução faseada, em função da morfologia do terreno e da ocupação antrópica”.

 O passeio foi acompanhado por informação gráfica, onde é feita uma abordagem histórico-arqueológica da evolução das muralhas, pelos responsáveis do Arquivo Histórico e Gabinete de Arqueologia. De acordo com os historiadores, do lado norte, o perímetro amuralhado conhecido como Cerca Velha “sugere uma fase de construção islâmica” e era completado pela torre albarrã e pelo corte de afloramento calcário junto à Porta da Talhada e também pela Torre do Facho.

 Na área do palco (na cerca do castelo) foram recolhidas cerâmicas islâmicas num depósito do século XIII, o que comprova a ocupação do local nos séculos XI ou XII.
Já do lado sul, o perímetro amuralhado chamado Cerca Nova indicia uma fase de construção “claramente cristã”, sustentam.

 Na Casa do Pelourinho foram encontrados sete silos, mas as obras feitas numa casa vizinha já tinham dado conta da existência de mais dois. Tratava-se, possivelmente, do celeiro da Igreja de Santa Maria, onde se recolhiam os direitos sobre as freguesias da paróquia.
Já entre os séculos XIII e XIV o perímetro das muralhas foi alargado para sul, envolvendo a Igreja de S. Pedro e tendo interrompido o caminho que ligava as vertentes ocidental e oriental do outeiro de Óbidos.

Foi há sete séculos que a muralha sofreu a última ampliação até à Torre do Facho, ficando com a planta actual. Na altura destruiu-se parte da muralha existente e reaproveitou-se o material pétreo na nova construção. A envergadura das obras implicou o “recrutamento de mão-de-obra na região, inclusive nos coutos de Alcobaça”, explicaram os historiadores, acrescentando que estas terão decorrido no quadro das guerras fernandinas ou da crise dinástica de 1383-1385.

 O registo arqueológico mostra que nos séculos XIV e XV houve uma intensificação da ocupação em toda a vila.
Esta iniciativa do programa Descobrir Óbidos está integrada nas comemorações do feriado municipal de Óbidos.

 Fátima Ferreira

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Agricultura do Oeste ameaçada se não chover.


As previsões meteorológicas colocam Portugal num cenário de seca extrema, a menos que o mês de fevereiro seja mais chuvoso do que o normal, dizem os meteorologistas, que apontam que mesmo a precipitação da primavera nunca é suficiente para corrigir a ausência de chuvas no inverno

 O mês de janeiro não trouxe a precipitação normal para a época do ano, daí que, se o sol continuar, Portugal terá um grave problema, com efeitos negativos para a agricultura, sobretudo.

 “Tem caído muita humidade, que faz com que não se notem plantas murchas, mas numa zona de produção intensiva se não chover vai ser um descalabro. O que choveu na semana passada não foi nada”, desabafa José Artur, presidente da administração da organização de produtores Horta Pronta, em Atouguia da Baleia, Peniche.

 “Tem de chover agora no inverno para depois na primavera o tempo ser adequado de forma a permitir às culturas crescerem”, aponta António Gomes, presidente da Associação Interprofissional de Horticultura do Oeste.

 A seca “não é uma ameaça que estejamos a sentir, contudo, se neste momento “não há falta de água” para regar os campos, o dirigente agrícola faz notar que “a continuar o tempo assim irá faltar água dentro de dois a três meses, porque não estou a ver que haja reservas suficientes”.

 Feliz Alberto Jorge, responsável da Associação de Agricultores do Oeste, indica que os proprietários de explorações e pomares que não disponham de sistemas de rega “é que vão sentir problemas”, comentando, no entanto, que a situação “até poderá levar a que os preços estabilizem, por não haver excesso de produção”.



Francisco Gomes

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Que viva a República!


O Governo quer suprimir feriados, a fim de estimular a "competitividade" e endireitar as finanças públicas. É um projecto ideológico, e uma continuidade de ideias e de processos de poder, demonstradamente autoritários. A Igreja está de acordo com ceder dois deles à hipótese governamental. Quanto aos feriados civis, prevê-se a abolição dos que comemoram o 1.º de Dezembro e o 5 de Outubro. Não é tão absurda como parece, esta circunstância. E o jogo de compromissos salta à vista, o que torna o assunto repugnante. As "cedências" da Igreja recaem em dois feriados "menores", se assim me posso exprimir (Corpo de Deus e Dia da Assunção de Nossa Senhora); mas os civis possuem uma forte conexão com argumentações históricas, aliás assinaladas num documento tornado público por professores catedráticos e investigadores.

A arteirice de que estas quatro eliminações ajudam à produção nacional não passa de isso mesmo: um ardil, que deveria envergonhar quem o propõe. O pobre Álvaro Santos Pereira, ele, sim, que dá a cara e é uma das causas das nossas insatisfações, fala na virtualidade estrutural da anulação dos feriados como quem resolve os nossos problemas de "competitividade." O homem, averiguadamente, não sabe o que diz. E ignora os documentos europeus sobre o trabalho, que nos colocam entre aqueles com maior quantidade de horas nos ofícios e nos mesteres.

Quando o extraordinário ministro afirma, por exemplo, que o 5 de Outubro será assinalado no domingo seguinte, como resolverá o ritual dos actos no Parlamento e no município? O hastear da bandeira, na câmara, pelo Presidente da República, vai ser adiado? O dislate causa compaixão. E as coisas complicam-se ainda mais quando António Costa declara que não alterará nenhuma das cerimónias habituais. Qual o papel do Dr. Cavaco neste imbróglio? E como se sairá o Executivo desta declarada confrontação?

O Dr. Passos Coelho comprou uma briga desnecessária. Indispôs republicanos, monárquicos com uma espécie de assunção autoritária, que adiciona, ao mal-estar geral, mais uma parcela de surda indignação. Surda, isso mesmo. Porque, na verdade, Mário Soares limitou-se a desacordar da ideia, assim como António José Seguro, com escassas aparências de repulsa. A esquerda que resta reduz-se a enunciações inoperantes.

E, no entanto, sobretudo o 5 de Outubro, além da efeméride que representa, foi um símbolo da Resistência ao fascismo. Salazar não permitia a sua celebração. Os que, mesmo assim, enfrentando espancamentos e até a cadeia, desciam às ruas para festejar a data nunca a esqueceram, durante o meio século que durou o salazarismo. A tentativa de amnésia histórica encontrou sempre a resposta contrária e corajosa de muitos homens e mulheres. É um dia de libertação e de liberdade que este Governo parece desejar ocultar. Mas a que os melhores de nós, certamente, se oporão.

 BAPTISTA-BASTOS - JN