quarta-feira, 23 de abril de 2014

Onde estão os críticos de Jesus?


Na ressaca dos três troféus perdidos no final da temporada passada, muitos não hesitaram em pedir a demissão de Jorge Jesus. Os argumentos eram vários, fosse pela arrogância demonstrada, pela pouca capacidade de gerir o esforço dos jogadores, pela parca aposta em futebolistas portugueses ou até pelo alegado sportinguismo.

Mas havia a outra face da moeda. A capacidade de Jesus em potenciar jogadores, em adaptar de forma absolutamente bem sucedida atletas a determinadas posições, e a “nota artística” que introduzia em grande parte das partidas, o seu cunho pessoal a um Benfica, que para muitos, jogava finalmente… à Benfica.

E mais, que treinador estaria à altura para o substituir? Que português disponível, com estofo e que garantisse um melhor serviço que JJ poderia orientar os encarnados? E que estrangeiro teria conhecimento necessário sobre as águias e o futebol português para vingar de imediato?

Quando algo vai mal num clube, nem sempre a solução é a drástica mudança de treinador. Quando uma equipa perde três competições nos últimos jogos é porque disputou as três frentes até ao fim. Existe um mérito por detrás do fracasso, mesmo que isso se tenha verificado várias vezes durante três anos.

Há quanto tempo o emblema da Luz não chegava a uma final europeia, ou só mesmo a uma meia-final? Com Jesus, o mínimo foi sempre os quartos-de-final, incluindo na Liga dos Campeões, em 2011/12. Há quanto tempo o Benfica não perdia apenas um jogo no campeonato? Há quanto tempo os encarnados não mantinham uma consistência exibicional? Quando é que antes se tinha assistido a um encaixe financeiro tão volumoso na história das águias?

JJ conseguiu marcos históricos, e nos primeiros três anos, conquistou mais títulos que a formação lisboeta nos treze anteriores. Razões mais do que suficientes para continuar? Acreditei que sim, que Luís Filipe Vieira também.

Afinal, mais do que uma mudança de treinador, urgia sobretudo alterar a filosofia de jogo, tornando o até então extremamente atractivo, ofensivo e vertical futebol do SLB, num modelo mais calculista, sereno e pragmático.

Os resultados estão à vista. O campeonato já está garantido matematicamente. Até há data, faltando disputar apenas duas jornadas, os encarnados têm 56 golos marcados. O pior registo do Benfica de Jesus neste aspecto foram os 61 apontados em 2010/11. Se mantiver a média (dois por jogo), chegará aos 60. Muito longe dos registos de 2009/10 (78) e 2012/13 (77) ou até de 2011/12 (66). De certa forma, prova o pragmatismo de 2013/14, que trava no 1-0 ou 2-0 para depois apenas gerir.

Também no número de golos sofridos é visível os encarnados estão a arriscar menos. Apenas 15 tentos consentidos até à 28ª jornada, e a menos que um imprevisto os faça sofrer mais cinco nos dois encontros que restam, este será o Benfica de Jesus com o melhor registo defensivo. O recorde é de 20, em 2009/10 e 2012/13.

Mas não foi só pela versatilidade que JJ silenciou os críticos. A cada época, uma nova adversidade: Na temporada de estreia, não havia um lateral-esquerdo de raiz que desse garantias. Em 2010/11, não houve ninguém que substituísse de um momento para o outro a capacidade todo-o-terreno de Ramires ou a magia de Di María. E em janeiro, partiu David Luiz, uma das referências. Em 2011/12, nem Emerson nem Capdevila renderam eficientemente Fábio Coentrão e a profundidade que este dava ao corredor esquerdo, muitas vezes o mais desequilibrador dos encarnados, mesmo partindo a tantos metros da baliza adversária. E quando em 2012/13, mesmo em cima do fecho do mercado, Javi García e Witsel foram transferidos e deixaram o plantel com escassez de médios? E mesmo este ano, quando Matic, considerado por muitos como o elemento-chave da equipa, foi vendido no mercado de inverno?

Com improviso e muito labor, o Benfica de Jesus já actuou em 4x4x2, 4x1x3x2, 4x2x3x1 e 4x3x3. Com pontas-de-lança móveis ou posicionais, com laterais ofensivos ou apenas consistentes defensivamente, com um ‘10’ puro ou com um segundo avançado e com extremos a procurarem verticalizar ou a explorarem diagonais, a qualidade do jogo foi sempre uma constante.

Antes de adaptações bem sucedidas ou de trabalho intensivo, Fábio Coentrão era apenas um extremo que tardava em afirmar-se e que passava por sucessivos empréstimos, Matic um trinco bom de bola mas fraco no posicionamento e Enzo Pérez um ala sem espaço no onze. Hoje, são futebolistas de topo nas suas posições.

O antigo técnico de clubes como os Vitórias, Belenenses e Braga, para além do campeonato conquistado esta época, ainda conseguiu um triunfo bastante pessoal, apesar da máxima descrição. No início da temporada, quando as coisas pareciam não caminhar no rumo certo, a sua autoridade foi posta em causa, quando Cardozo, depois do incidente no Jamor em maio de 2013, foi reintegrado no plantel. Se no começo ainda marcou vários golos, foi quando o paraguaio se lesionou e praticamente não mais voltou como titular que os encarnados encavalitarem rumo ao título. Foi o ano com pior registo do Tacuara, com JJ ao leme. Apenas sete golos marcados na Liga, contra os 26, 12, 20 e 17 do antecedente. E mesmo em termos de jogos, até há data Cardozo soma apenas catorze, dos quais somente cinco enquanto titular. Também aqui, o pior registo do sul-americano.

Das pequenas vitórias pessoais aos títulos conquistados, com passagem pelos recordes batidos e adaptações bem sucedidas, os críticos não ficaram com outro remédio que não seja renderem-se às evidências. E a época ainda não acabou. Depois do que aconteceu há um ano, é de duvidar que o Benfica seja negligente no Jamor e deixe escapar a dobradinha. E mesmo na Liga Europa, o discurso humilde perante a força da Juventus deixa transparecer que a eliminação será vista com normalidade. Tudo o que vier por acréscimo, será bem-vindo.

E se em Julho/Agosto poucos acreditavam numa temporada assim, agora até se fala insistentemente em início de um novo ciclo no futebol português, contrariando a hegemonia do FC Porto no pós-25 de Abril. É caso para perguntar: Onde estão os críticos de Jorge Jesus?

http://davidjosepereira.blogspot.pt/2014/04/onde-estao-os-criticos-de-jesus.html

domingo, 13 de abril de 2014

Primeiro-Mentiroso!




Passos Coelho, quando candidato nas últimas eleições, prometeu o céu. Mas remeteu-nos ao inferno. Em campanha, tinha garantido que jamais aumentaria impostos. Afiançou também que não seria necessário baixar salários, pensões e reformas ou retirar subsídios. 
O equilíbrio das contas públicas far-se-ia com a redução de gorduras nos sectores intermédios do estado, a diminuição das rendas das parcerias público-privadas e, a longo prazo, com uma profunda reforma da Administração. Dois anos volvidos, conclui-se que Passos Coelho aplicou medidas precisamente opostas às que tinha prometido. Mentiu-nos, numa atitude em que foi acompanhado pelo seu parceiro de coligação. 
O CDS defendia a diminuição da carga fiscal, até chegar ao governo e se tornar cúmplice do seu agravamento. O antecessor de Passos, José Sócrates, fez o mesmo. Prometendo não aumentar impostos, não tardou em fazê-lo quando subiu ao poder. Mais um mentiroso. Da mesma forma, Durão Barroso tinha anunciado, na campanha de 2002, um choque fiscal, com uma brutal redução de impostos. Mal tomou posse, a primeira medida tomada pela sua ministra das finanças, Manuela Ferreira Leite foi… aumentar impostos. 
O comportamento de dirigentes que, deliberadamente, enganam o povo em campanha não é admissível. A democracia só é autêntica quando se contrapõem, nas eleições, projetos alternativos. Os eleitos devem-se sentir obrigados a honrar e implementar o programa vencedor. Não há desculpas para não cumprir, nem mesmo o desconhecimento da realidade concreta. 
Quem se candidata a lugares desta importância não pode revelar tamanha incompetência. Com estas práticas de mentira reiterada, desacredita-se todo o sistema democrático. Os deputados votam leis contrárias ao programa a que se vincularam em campanha, violando assim a lealdade que devem aos seus eleitores. 
Os partidos do arco do poder transformaram os processos eleitorais, que deveriam servir para o debate de ideias e confronto de projectos políticos, em circos de sedução em que acaba por ganhar quem é mais eficaz a enganar os cidadãos. As eleições transformaram-se em concursos para a escolha do melhor mentiroso. O troféu em jogo é a chefia do governo.


Paulo Morais, Professor Universitário - CM