terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Portugal precisa de uma sociedade aberta e inclusiva!


Portugal é um país sério, como se vê pela sua história. Infelizmente, foi governado de forma pouco séria durante uma parte significativa dos séculos XIX  e XX. O poder foi, frequentemente, tomado de assalto por pequenos grupos, que a cultura dominante acolheu. A base social em que a direcção do país assenta alargou-se após a Revolução de 1974, mas na prática permanece restrita e limitada a uma pequena elite. Embora esta elite seja hoje mais vasta que no passado, é a mentalidade que conta. Portugal não é ainda uma sociedade aberta.

 Mesmo países muito desenvolvidos tendiam até muito recentemente (digamos, até ao final da década de 1960) a manter-se relativamente fechados. Quem, a título de exemplo, negaria o domínio da minoria anglo-saxónica branca nos EUA e das classes mais altas em Inglaterra até àquela época? As tradições democráticas nesses países não puseram verdadeiramente termo a esta situação; na prática, só os membros do clube tinham verdadeiro poder. Mesmos os mais empreendedores tinham dificuldade em obter financiamento. Foram as necessidades económicas e de crescimento que ditaram a mudança e a passagem a uma sociedade aberta onde os direitos humanos ou os direitos das mulheres ou de outras minorias eram respeitados.

 Em Portugal, o processo de abertura tem vindo a atrasar-se, podendo até dizer-se que a Revolução de 1974 nunca chegou a ser concluída e que a mentalidade antiga parece ainda prevalecer. Nem mesmo os governos socialistas consideraram que esta abertura constituísse uma prioridade. Pelo contrário, políticos de todas as ideologias usaram as ferramentas ao seu dispor para tentar aderir a este pequeno grupo dirigente, adoptaram o seu espírito o mais rapidamente que conseguiram, e ajudaram a mantê-lo fechado em troca do seu acolhimento e do das suas famílias. O país enferma deste vício mais do que muitas pessoas pensam ou do que é imediatamente visível.

 Muito embora não considere o ensino português deficiente, a taxa de abandono escolar no ensino secundário é invulgarmente alta. O motivo é claro: os pais não vêem no ensino grande benefício, numa sociedade que sentem como pouco acolhedora e onde as cunhas serão sempre determinantes.

 Ao sucumbir a um “esquema” político na nova gestão da CGD, o novo governo demonstrou, quase antes de estar constituído, que permanece profundamente arreigado a este mundo de nepotismo ou àquilo que na prática é uma forma de corrupção profundamente enraizada, e que deixa muitas dúvidas relativamente ao progresso económico. Portugal não constitui caso isolado – o caso da Itália ocorre imediatamente à nossa mente, e certamente o da Grécia – pelo que não se pode depositar grande confiança numa mudança de mentalidades.

 Fala-se de fraquezas macroeconómicas, da deterioração do sistema bancário, da sobreprotecção do emprego, de um sistema de previdência social que, em Portugal, tal como no resto do mundo, é incomportável e foi tomado de assalto pela classe média, da falta de crescimento. Tudo isto são assuntos válidos e sérios, mas é a componente social e cultural que constitui a característica decisiva. Não consta da lista da troika, que poderá não compreender o assunto em toda a sua dimensão ou querer envolver-se no mesmo, mas ao não lidar com esta componente Portugal reduz-se, por escolha própria, ao nível dos países em desenvolvimento, o que, em última análise, é sinónimo de declínio. Com esta postura, o país não conseguirá renovar-se adequadamente, retomar o crescimento e alcançar os outros países.

Infelizmente, muitos acreditam que será necessária uma crise ainda maior para que o país mude os seus hábitos. Isto significa que só uma catástrofe alcançará este objectivo. Trata-se de uma falha da democracia, que afinal só é capaz de se autolimitar pela adversidade. Um bom político veria aqui uma grande oportunidade: recuar para expectativas mais realistas no quadro de um forte programa de reforma social e não apenas económica. Uma maneira de o fazer? Quem quer que proponha uma tia, primo ou amigo para um novo emprego será imediatamente despedido!

Jan Dalhuisen

 Professor catedrático

 Universidade da Califórnia (Berkeley), King’s College (Londres) e Universidade Católica Portuguesa (Lisboa)

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