quarta-feira, 15 de abril de 2009

Padre rali


…Paulo Gerardo não faz o trabalho de cinco. Mas quase. Juntamente com o recém padre João, tem sete paróquias, em nove freguesias na zona de Óbidos. E se, já diz o ditado, "paróquia viva, pároco morto", de cansaço, entenda-se, aqui a vida corre depressa, é estafante.

O domingo começa cedo, pois o rali paroquial, como dizem na brincadeira, tem de levar Paulo a celebrar quatro missas. Às 8.35, o carro já está a trabalhar e de casa, na Amoreira, sai disparado para a Usseira, paróquia onde os crentes aguardam no largo. Pormenores de última hora, vestir-se, distribuir o jornal da diocese, trocar impressões com catequistas e responsáveis da equipa de animação local, e está na hora de subir ao altar. Uma hora depois, deixados os avisos, e trocadas algumas palavras rápidas com alguém que se atravessa no caminho, está na altura de entrar no carro, e seguir viagem. Não sem antes tomar um café rápido, em pé, e enquanto larga uma moeda para comprar uma rifa a uma criança.

Há dois anos que Paulo anda nesta lufa-lufa, numa tentativa de dinamizar um grupo de paróquias meio adormecidas. "Ainda não estamos em velocidade de cruzeiro. Mas queremos criar uma dinâmica inter paroquial, sem que cada paróquia perca a identidade", explica, sublinhando que o truque é fomentar a relação entre as pessoas. "Ser cristão é viver em relação", foi o slogan do ano pois, diz, "a Igreja existe para levar o evangelho e para que o relacionamento entre as pessoas seja mais fraterno e humano". Por isso, em cada paróquia criou-se o grupo de mensageiros que levam os convites da igreja de casa em casa.

A resposta à falta de padres, afirma, "passa também por contar mais com os leigos. É difícil comprometer as pessoas, é verdade, mas às vezes também não é assim tão difícil como se apregoa", diz, no caminho sinuoso até ao Vau, onde já está tudo a postos para a missa. "O que é a Quaresma?", interpela os mais pequenos na homilia, levando na volta a resposta: "o tempo em que comemos menos doces e guardamos o dinheiro para dar a quem mais precisa", diz uma criança na fila da frente.
Cativar os mais novos é outro objectivo desta equipa de dois padres, hoje desfalcada porque o mais novo está num retiro. O que passa por pô-los a participar na missa, preparando as leituras e expondo a mensagem em cartazes e frases simples. "Nem sempre é fácil", confessa Paulo Gerardo, já a entrar no carro para se dirigir à paróquia principal: Óbidos.

Hoje é um daqueles dias em que entrar na vila amuralhada é quase missão impossível, pois o Festival do Chocolate faz rumar a Óbidos milhares de pessoas. A missa é ao meio dia, meia hora depois de acabar a do Vau, a dez quilómetros de distância, mas o drama é mesmo estacionar e correr até à Igreja de S. Pedro, abrindo caminho entre a multidão. Aqui a audiência é mais distinta, a igreja maior e com direito a visitas turísticas, mas a mensagem a pregar é a mesma: tempo de Quaresma, tempo de oração, penitência e jejum. No fim, mesmo com a barriga já a dar horas, é preciso conversar com os crentes, acertar assuntos com o diácono, e até dar uma palavra de conforto a um paroquiano que parece não estar bem.

Ao fim da terceira missa, a paragem é no restaurante, onde ao padre Paulo se junta para o almoço o colega que veio de Lisboa dar uma mãozinha na ausência do padre João. Também aqui o descanso é relativo, pois é preciso cumprimentar, dar uma palavra de atenção, atender o telemóvel. "Costumo dizer às pessoas que tenho tempo para tudo, pode é não ser quando elas querem", explica o padre que, além das missas, tem de arranjar horas para confessar, visitar doentes, ouvir pessoas, orientar grupos, preparar encontros e até dirigir obras na igreja. Na vida de pároco, não há escritório, rotinas, nem expediente mas, diz, devia sobrar mais tempo para ler e rezar.
Como hoje não é dos domingos em que a tarde fica livre, é preciso celebrar mais uma missa no Sobral da Lagoa às 15.30. As fatiotas mais aprumadas e a agitação no átrio revelam que qualquer coisa está para acontecer. É a bênção dos bebés, cerimónia que percorre todas as paróquias, em alusão a um episódio da vida de Jesus, e que enche a igreja. Pelo menos, hoje, que é dia de festa.

DN

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