Revoltemo-nos e mobilizemo-nos contra a desvalorização do
trabalho, contra a exploração oportunista, contra a ausência de dignidade com
que tratam os trabalhadores. É ignóbil pagar a um enfermeiro ou enfermeira
menos de 4 euros por hora, a jovens engenheiros, arquitetos, designers,
economistas, etc., entre 400 e 600 euros por mês, impondo-lhes até a utilização
de viaturas próprias para fazerem o trabalho.
É vileza e malvadez fazer-se toda uma campanha de motivação
dos jovens para que façam formações com qualidade, e depois, por exemplo, os
grandes escritórios de advogados, os grandes meios de Comunicação Social,
múltiplas empresas das mais diversas áreas, explorarem estagiários e
profissionais em início de carreira, colocando-os a fazer trabalho normal sem
retribuição ou a troco de míseros subsídios.
É revoltante observarmos multidões de trabalhadores que em
call centers, ou noutras atividades, são remunerados por valores que oscilam
entre os 2 e os 3 euros por hora.
Não se admite que o salário mínimo nacional (SMN) continue
tão baixo e que existam dezenas e dezenas de milhares de trabalhadores a quem
nem sequer o SMN é pago, enquanto alguns senhores se abotoam com centenas de
milhares ou milhões de euros por ano.
É ainda revoltante ver governantes, serviços públicos como o
IEFP, gestores ou patrões instalados, académicos ao serviço do sistema
dominante a responsabilizarem individualmente os jovens pelo seu futuro,
vendendo-lhes a trapaça do "empreendedorismo" neoliberal como solução
milagrosa que tudo vai resolver.
A redução violenta dos salários, o desemprego em massa e a
generalização das precariedades no trabalho constituem-se hoje,
inequivocamente, como três opções estruturantes das políticas que vêm sendo
impostas aos portugueses. Não tenhamos dúvidas: elas fazem parte dos grandes
objetivos a atingir pelo "governo interno" (de Passos Coelho) e pelo
"governo externo" (da troika e C.ª), que as determinam como
"necessidade".
A crise surge a justificar o desemprego, o corte nos
salários, as instabilidades e inseguranças no trabalho, mas estas duras realidades
foram e são "matéria-prima" da gestação e do aprofundamento da
própria crise. Serviram o cavalgar da ofensiva neoliberal, tornando a sociedade
cada vez mais carregada de desigualdades na utilização e distribuição da
riqueza; agora, aceleradamente, estão a alimentar um perigoso retrocesso social
e civilizacional.
Este retrocesso tem como alvo fundamental o trabalho, o seu
valor e os direitos laborais e sociais a ele associados.
O trabalho é atividade produtiva indispensável para a
criação de "valores" de uso e de troca. É imprescindível que a
economia seja sustentada pelo trabalho e não por processos de financeirização e
especulação.
O trabalho, valorizado e impregnado de comportamentos
responsáveis, é espaço primordial de socialização. Em muitas situações tem até
mais importância que o espaço família.
O trabalho digno, inserido num processo de efetivo
desenvolvimento e sustentando-o, convoca aprendizagens e qualificações e
desenvolve-as, sendo motor de avanços tecnológicos e organizacionais, de modernização
de empresas e serviços.
A valorização do tempo e das condições de trabalho é a única
via segura para valorizar o tempo e as atividades do não trabalho. Um homem ou
mulher que trabalha deve ter condições para efetivar o seu trabalho com motivação,
dignidade e responsabilização, e a sua condição de trabalhador não pode tolher
a condição de cidadão e do ser humano pleno. Se não houver salários dignos e
tempo para a família, para a formação, para o lazer, para a participação cívica
e política, jamais se sustentará um conjunto de atividades importantes das
sociedades modernas desenvolvidas e a democracia será estrangulada.
O salário não é um mero custo. Ele dinamiza a economia.
Entretanto precisamos de substituir as loucuras do enfoque à competitividade e
à produtividade por objetivos de desenvolvimento humano, mas isso não será
feito com ataque aos valores do trabalho.
Pela via da desvalorização do trabalho não se encontrará o
desenvolvimento, o progresso, a justiça social a que o povo português tem
direito.
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