É um tempo para pararmos um pouco, olharmos à nossa volta e
reflectirmos sobre aquilo que fizemos, aquilo que deixámos de fazer, aquilo que
não devíamos ter feito, aquilo que podíamos ter feito melhor", afirmou
Cavaco Silva durante a sessão de apresentação de cumprimentos natalícios por
parte do Governo.
Não é de crer que o homem que
nunca se engana e raramente tem dúvidas tenha, por uma vez, resolvido anunciar
uma introspecção. De alguém que continua a tentar fazer-nos de parvos e diz que
as suas palavras sobre as suas pensões foram mal interpretadas quando todos as
ouvimos claramente, não podemos esperar grandes actos de contrição.
Por estas e outras não faltou
gente a interpretar aquela frase como um recado ao Governo e não como uma
espécie de mea culpa. No fundo, uma troca de recados: o primeiro-ministro
mandou um recado a Cavaco Silva quando falou - de forma ignorante e imprudente
pondo em causa a solidariedade entre gerações, essencial ao equilíbrio da
comunidade - sobre "pessoas" que não descontaram o suficiente para
ter as reformas de que hoje desfrutam e o Presidente da República tratou de
mandar outro recado incentivando Passos Coelho a reflectir. Digamos que estamos
bem entregues quando, num momento como o que passamos, Presidente e
primeiro-ministro se divertem a mandar recados um ao outro.
É provável que a santíssima
trindade composta por Passos, Gaspar e Relvas, essa entidade una e indivisível,
não tenha consciência do mal que está a fazer ao País e da catástrofe que está
a semear. O Presidente da República também ainda não percebeu que está a ser
conivente por acções ou omissões da dita trindade, e que os cidadãos entendem
que ele é parte integrante da equipa que está a destruir a classe média, a
condenar gente, sobretudo de meia-idade (que não mais vai conseguir arranjar
emprego) à miséria e a fazer regredir social e economicamente o País muitas
dezenas de anos.
Não, não foram apenas as suas
infelicíssimas declarações sobre as suas pensões, não foi aquele inominável
discurso em que ofendeu tudo e todos aquando da sua vitória eleitoral, não foi
o episódio das escutas (que em qualquer país civilizado teria levado à demissão
do Governo ou do Presidente da República) que faz com que Cavaco Silva seja o
Presidente da República mais impopular da história da democracia. Não é em vão
que sondagem após sondagem Cavaco Silva reúna mais opiniões desfavoráveis que
Seguro, Paulo Portas ou até do duo dinâmico Martins/Semedo - só mesmo Passos
Coelho é mais impopular que ele. Nada disto surpreende: além de o sentirem
colaborar com o Governo, os portugueses não conseguem perceber a sua
importância. Cavaco Silva conseguiu tornar o cargo de Presidente da República
irrelevante.
PEDRO MARQUES LOPES - DN
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