
Jean Barois foi um rapaz do meu tempo, porque no meu tempo de rapaz (anos 60) ainda se liam histórias do princípio daquele século. Roger Martin du Gard escreveu, 1913, O Drama de Jean Barois, a história de um jovem católico que, em adulto, descrê porque a Ciência lhe explica tudo; mas, velho, Barois retoma a fé antiga. Martin du Gard, que será Nobel em 1937, conta o drama sem tomar partido, mas deixando-nos com a suspeita de que o trajecto é inevitável.
Do nosso sucessor de Roger Martin du Gard, José Saramago, não sei se em jovem acreditou. Sei é que, chegado a idade quase bíblica, não se deixou intimidar pela hipótese - mesmo para o mais férreo dos ateus, hipótese (que parece que se avoluma com a idade) - de vir a prestar contas depois desta vida. Pois Saramago diz que não vai por aí, como outro poeta português já o disse, e tão pouco português é, no ser radical. Saramago diz que escreveu Caim porque é "contra toda e qualquer religião". E das religiões, todas, ele diz o que quer: "Acabar com elas." Da tarefa, não tem ilusões: "Não será possível, mas ao menos tentemo-lo." Ser velho e continuar a tentar - e nessa coisa tão íntima e temível que é a religião, e indo a contracorrente - é simplesmente admirável.
Ferreira Fernandes
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